A Peste Suína Africana (PPA) é uma doença hemorrágica altamente infecciosa que afecta os porcos domésticos e javalis,europeus, provocando enormes perdas económicas nos países afectados sendo de declaração obrigatória à Organização Mundial de Sanidade Animal (OIE).
Neste artigo descreve-se como é que os investigadores modificaram uma estirpe virulenta do vPSA, isolada em Badajoz em 1971 (BA71), através da eliminação específica de um único gene, a hemaglutinina viral, transformando-a em vírus atenuado (BA71∆CD2) que pode ser utilizado para vacinar e proteger os porcos, de forma experimental, tanto contra a referida estirpe virulenta (virus parental), como contra outras estirpes vPSA diferentes.
O facto de que um vírus atenuado confira protecção contra a infecção com o vírus do qual procede não é novidade e há numerosos trabalhos publicados onde se consegue esta protecção contra estas estirpes denominadas homólogas. A novidade deste trabalho é que, utilizando uma dose adequada do vírus atenuado BA71∆CD2, os investigadores foram capazes de proteger os porcos de forma 100% efectiva contra outro vírus, o E75 (Espanha 1975) que, por trabalhos anteriores realizados no laboratório do CReSA, sabe-se que é um vírus não homólogo ou heterólogo.
Graças a este estudo, sabe-se também que a protecção conferida é dependente da dose utilizada e, que a protecção cruzada obtida in vivo entre as diferentes estirpes se correlaciona com a capacidade que o candidato vacinal BA71∆CD2 tem de induzir células T-CD8+ capazes de reconhecer ambas as estirpes, BA71 e E75 in vitro.
Com estes bons resultados em mão, quis-se avançar mais um passo e averiguar se o candidato vacinal BA71∆CD2 era capaz de proteger os animais contra infecção com a estirpe que está actualmente a circular na Europa, a denominada Georgia 2007/01. Esta é uma estirpe muito mais distante, filogeneticamente falando, de BA71 do que é E75, pertencendo inclusivamente a um genótipo diferente. Os resultados obtidos desta experiência foram impressionantes, pois todos os animais que receberam a dose adequada de BA71∆CD2 sobreviveram à infecção com a estirpe heteróloga altamente virulenta Georgia 2007/01.
Os resultados aqui obtidos vão mais além de poder demonstrar uma protecção contra Georgia 2007/01, contra a qual já começam a aparecer outros protótipos experimentais, abrem também a possibilidade de poder proteger contra vírus muito diferentes com uma só vacina, algo essencial sobretudo pensando nas zonas endémicas nas quais há muitos vírus diferentes a circular ao mesmo tempo, como acontece em zonas da África Subsahariana.
O facto de que o BA71∆CD2 possa ser produzido numa linha celular estável (COS-1) em vez de em macrófagos primários, como até agora, abre a possibilidade de uma futura exploração comercial. A ausência da hemaglutinina do vírus dificulta, por um lado, a transmissão por caraças do BA71∆CD2, já que esta proteína é um factor chave para isso e por outro, permite diferenciar os animais vacinados dos infectados através de um simples ensaio de inibição da hemaglutinação e/ou de hemadsorção.
Apesar dos bons resultados obtidos, alguns dos animais vacinados mostraram certos níveis transitórios de vírus no sangue e em secreções nasais, impedindo assegurar a 100% a sua inoquidade em campanhas massivas de vacinação no campo. Deste modo, o desafio principal centra-se agora em tentar melhorar a biossegurança da vacina e em paralelo, melhorar os métodos diagnósticos que tornem possível diferenciar com facilidade os animais que tenham sido vacinados dos que se tenham infectado de forma natural (DIVA: Differentiating Infected from Vaccinated Animals).
Monteagudo PL, Lacasta A, López E, Bosch L, Collado J, Pina-Pedrero S, Correa-Fiz F, Accensi F, Navas MJ, Vidal E, Bustos MJ, Rodríguez JM, Gallei A, Nikolin V, Salas ML, Rodríguez F. 2017. BA71ΔCD2: A new recombinant live attenuated African swine fever virus with cross-protective capabilities. J Virol JVI.01058-17.