Introdução
A relação entre alterações climáticas e doenças infecciosas é, no mínimo, complexa. Desde sempre as doenças animais apareceram e evoluiram, mudando por diferentes motivos, entre os quais se encontram as alterações ambientais e ecológicas, as migrações humanas e dos seus animais domésticos, a evolução de hospedeiros e patógenos e as alterações na fauna silvestre e as distribuições de vectores. Estes factores foram relevantes na pré-história e continuam a sê-lo na actualidade (Arzt et al., 2010). Contudo, desde o início do aquecimento global, há evidências de mudanças aceleradas na distribuição ee habitat; mudanças que, por sua vez, podem alterar o comportamento de algumas doenças ou do seu aparecimento. O presente não é a primeira alteração climática da história da Terra: durante os últimos 100.000 anos aconteceram bruscas alterações de temperatura, enquanto que nos últimos 10.000 tem permanecido estável de uma forma inusual (Lovejoy 2008). Durante este período surgiu a agricultura, domesticaram-se muitas espécies animais e criaram-se as povoações humanas. Isto levou-nos a pensar que a estabilidade climática é a norma, contudo não devemos assumir que o clima permanecerá estável: os primeiros 90.000 anos deste período indicam que a instabilidade é um padrão mais comum e cada vez há mais evidências do impacto humano, mediante a geração de gases com efeito de estufa, que estão a forçar uma nova mudança. Os níveis actuais da concentração de gases de efeito de estufa levaram, desde meados do Século XX, a um aumento da temperatura global média de 0,75 ºC e as previsões indicam que esta temperatura continuará a aumentar (Manning et al., 2007). Portanto, não há dúvida de que estamos num período de alteração climática em que deveríamos esperar profundas implicações epidemiológicas.
Fig 1. Temperatura dos últimos 100.000 anos
Alterações de temperatura nos últimos 100.000 anos estimados a partir de isótopos de oxgénio encontrados em cilindros de gelo na Gronelândia
A soma do impacto das alterações climáticas e da globalização já se pode detectar a muitos níveis: mudança em padrões meteorológicos, em ecossistemas, em migrações humanas e animais e na distribuição de vectores e doenças, parr citar uns quantos. As implicações destas mudanças são numerosas e, em alguno casos demostraram ser imprevisíveis. Deste modo as alterações climáticas converteram-se num problema que não pode ser ignorado por mais tempo e entender as alterações e as implicações que derivam directa ou indirectamente dela é essencial para a nossa sobrevivência ou, pelo menos para a sobrevivência da vida tal como a conhecemos hoje em dia.
Como as alterações climáticas contribuem para a doença
Uma consequência das alterações significativas e permanentes para o nosso clima é a alteração dos padrões de doenças nos humanos e animais. Estas alterações podem incluír o aparecimento de novos sindromas e uma alteração na prevalência de doenças existentes, especialmente as que se transmitem por insectos (Summers, 2009). Os vectores podem chegar a novas áreas geográficas estendendo-se a áreas não imunes onde podem recrutar novos vectores ou novas estirpes comportando a extensão a novos hospedeiros (Purse et al., 2005). Nem todos os patógenos serão igualmente afectados pelas alterações climáticas e, ainda que para alguns possa significar um aumento de área de influência, para outros pode significar uma diminuição (Lafferty, 2009).
As previsões indicam que as alterações climáticas trarão temperaturas mais quentes e maior humidade o que, por sua vez afectará a vegetação. Estas alterações mudarão a sobrevivência e distribuição dos artrópodes. De todas as mudanças associadas ao clima, o impacto sobre os artrópodes e a sua distribuição é a mais evidente. As temperaturas cálidas aumentarão os títulos virais nos vectores assim como a sobrevivência dos vectores de estação em estação assim como aumentará a sua frequência de picada (Reiter, 2001). Deste modo, o aumento da temperatura pode comportar mudanças no número de gerações de um vector e na abundância global de insectos que, por sua vez, pode alterar a dinâmica da população de vectores e a transmissão de doenças (de La Rocque et a., 2008). Para entender a dinâmica da doença é vital compreender a capacidade dos vectores. Muitas doenças animais importantes têm insectos (mosquitos ou carraças) no seu ciclo de transmissão. A doença da Lingua Azul em vacas, PSA em porcos ou Febre do Vale do Rift em ruminantes são apenas alguns exemplos. Em humanos o principal seria a Malária.
Os padrões de precipitação também podem ver-se alterados, o que pode ter um claro impacto no ciclo de vida de patógenos e doenças (de La Rocque et al., 2008). Concretamente a acumulação inesperada de água pode facilitar a multiplicação de mosquitos que servirão de reservatórios e transmissores de doenças. Além da alteração nas precipitações, pode incrementar-se a frequência de fenómenos meteorológicos severos que podem afectar mais a distribuição de vectores que as próprias alterações climáticas. Estas alterações são frequentemente regionais e podem ter um grande impacto ao nível local.
A densidade da população de roedores e a sua distribuição é muito sensível às alterações climáticas, além de ser também à distribuição humana (Semenza e Bettina 2009). Os roedores podem actuar como hospedeiros directos ou como hospedeiros para artrópodes como pulgas e carraças como no caso da peste (Yersinia pestis). Os climas temperados e com muita precipitação favorecem o desenvolvimento das populações de roedores, que podem aumentar mais pela interacção com humanos. Isto é especialmente importante para vírus como o hantavirus, para o que ratos e ratazanas são reservatórios naturais. O aumento das populações de roedores pode facilitar a entrada destes vírus com humanos, especialmente em áreas urbanas ou em zonas onde uma higiene inadequada contribua para uma infestação por roedores.
Ao modificar as condições que favorecem os vectores e patógenos, as alterações climáticas têm o potencial de alterar a exposição de humanos e animais a doenças infecciosas (Dobson 2009). Deste modo os transmissores de doenças podem expandir-se para altitudes e latitudes onde não estavam presentes, tal como foi comprovado com a Malária (Lindsay e Martens 1998). Por sua vez isto pode afectar a exposição de populações a novos patógenos e a chegada destes a zonas onde novos anfitriões se vejam afectados. A carência de imunidade nestas populações pode ter efeitos devastadores, resultando num aumento da mortalidade e da morbilidade (Dobson 2009).
Alterações climáticas e doenças animais
As alterações climáticas nos últimos 100 mil anos trouxeram alterações nas doenças animais e nos seus vectores.
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