O aparecimento de diarreias é um grave problema na produção suína que causa sofrimento aos animais, necessita do uso de antibióticos e acaba por trazer grandes perdas económicas.
O intestino delgado é a parte mais comprida do tracto gastrointestinal bem como o principal sítio de absorção de nutrientes, mas também é uma importante zona de colonização por parte de agentes patogénicos. A mucosa é a camada em contacto com o lúmen intestinal e é capaz de aumentar extraordiariamente a sua superfície de absorção graças à presença de projecções denominadas villi que estão cobiertas porenterócitos (Figura 1). As criptas encontram-se na parte baixa dos villi e aqui é onde se produz a diferenciação dos enterócitos que vão migrando para a zona alta produzindo-se uma substituição contínua destas células. A cobrir os villi encontra-se uma camada viscosa denominada mucus, a qual protege a mucosa das secreções digestivas, de agentes patogénicos e de danos físico-químicos. O referido mucus é formado por mucinas secretadas por células denominadas caliciformes, distribuídas ao longo da mucosa e por enzimas antibacterianas e por anticorpos. Assim pois, o mucus e a camada de enterócitos são a primeira barreira protectora no intestino delgado (van Dijket al., 2002).
Figura 1: Estrutura da mucosa do intestino delgado (modificado de Sommer e Bäckhed, 2013).
O desmame implica duas mudanças críticas para os leitões; por um lado, os animais são separados das mães, misturados e levados para as baterias, provocando-lhe um forte stress; por outro lado, produz-se uma mudança brusca de alimentação já que passam directamente do leite materno para um ração sólida. Isto provoca uma grande descida da ingestão que leva a uma diminuição da nutrição luminal com consequências na saúde e no rendimento dos animais (figura 2).
Figura 2. Esquema do efeito do desmame na função barreira da mucosa,
nos rendimentos e na saúde dos leitões (traduzido de Vente-Spreeuwenberg e Beynen, 2003).
Nos primeiros dias após o desmame, a integridade do epitélio do intestino delgado vê-se comprometida, produzindo-se uma redução no comprimento dos villi. Pluske et al. (1997) postularam que a referida atrofia se pode dever a duas causas:
- O aumento da perda celular acompanhada por uma maturação mais rápida dos enterócitos que produziria um aumento da profundidade das criptas, devido a um desafio microbiológico ou à presença de componentes antigénicas no alimento.
- A diminuição da taxa de renovação dos enterócitos devido a uma queda na divisão celular nas criptas, provocada pelo jejum.
A quantidade e qualidade do mucus pode-se ver afectada por alterações na integridade epitelial e, se for danificado, permitiria um acesso mais fácil de agentes patogénicos ou compostos nocivos aos enterócitos (Vente-Spreeuwenberg and Beynen, 2003).
O bordo apical dos enterócitos, também conhecido como bordo em escova, apresenta projecções denominadas microvilli e é a zona de absorção de nutrientes. A diminuição do número de enterócitos maduros pode provocar uma má absorção. Além disso, a actividade enzimática desta região é determinada pela comprimento dos villi e pela maturidade dos enterócitos (Vente-Spreeuwenberg and Beynen, 2003) e, em consequência, ver-se-á afectada pelas mudanças descritas previamente causando má digestão.
Os enterócitos estão interligados por uniões estreitas (tight-junctions) que controlam o fluxo paracelular (entre células), evitando a entrada de agentes patogénicos ou tóxicos através da mucosa. A perda de integridade da camada de enterócitos facilita a invasão por essas moléculas provocando uma resposta inflamatória. Os mecanismos envolvidos na resposta imunitária não serão tratados aqui mas estes implicam efeitos negativos como anorexia, febre e inibição do crescimento (van Dijket al., 2002).
Após o período de jejum costuma produzir-se um grande aumento da ingestão obrigando o estômago a esvaziar o seu conteúdo mais rapidamente para manter o seu pH baixo; desta forma pode passar uma maior quantidade de bactérias para o intestino delgado, que ainda não estará recuperado das lesões anteriormente descritas, facilitando a colonização por parte de agentes patogénicos. Além disso, o aumento da ingesta numa situação de má absorção e má digestão desencadeará uma série de eventos que resultarão no aparecimento de diarreias (van Beers-Schreurs e Bruininx, 2002).
Em resumo, O desmame desencadeia uma série de alterações que levam à redução da ingestão e à deterioração da arquitectura intestinal resultando, em última instância, no aparecimento de infecções, diarreia e baixo rendimento dos animais. Numerosos estudos estão-se a levar a cabo para procurar estratégias que minimizem o impacto do desmame na morfologia e na função intestinal; alguns exemplos apresentam-se na Tabela 1.
Tabela 1. Estratégias para reduzir o impacto do desmame na morfologia e função intestinal.
Antioxidantes para evitar a rancificação da ração | Dong y Pluske (2011) |
Inibidores do crescimento de fungos para evitar o aparecimento de micotoxinas | |
Substâncias palatáveis (leite em pó desnatado, soro de leite, plasma suíno desidratado) | |
Saborizantes e potenciadores do sabor | |
Suplementação com alguns aminoácidos (glutamina, glutamato, arginina) | Lallés et al. (2004) |
Administração de rações de desmame sob a forma líquida | |
Fontes de proteína e energia mais digestíveis |