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Estratégias para garantir a segurança das rações

Nesta série de artigos, pudemos discutir os principais conceitos de segurança e medidas preventivas para garantir a segurança e a qualidade das rações.

Neste terceiro e último artigo, vamos analisar diferentes ferramentas para mitigar os riscos de contaminação biológica e os seus consequentes prejuízos produtivos e económicos.

Os alimentos e as matérias-primas destinados ao consumo animal podem, por vezes, ser vectores de contaminação de microrganismos patogénicos que podem prejudicar a saúde, o bem-estar e o rendimento dos suínos. Os principais microrganismos patogénicos que contaminam as rações são Salmonella spp. (quadro 1), Clostridium spp. e Escherichia coli, representando um risco não só para os animais, mas também para os trabalhadores das explorações e das unidades de transformação de carne, bem como para os consumidores de produtos à base de carne (Mariotti et al., 2022).

Outros microrganismos com um impacto importante na produção de suínos entraram nos estabelecimentos de produção através das rações e/ou das matérias-primas. Tal como citado por Songkasupa et al. (2022), a introdução do vírus da diarreia epidémica dos suínos (PEDV) na América do Norte em 2013 e 2014 deveu-se à contaminação de rações. Desde então, a biossegurança das rações para minimizar o risco de doenças animais transfronteiriças tornou-se de grande importância.

Tradicionalmente, as fábricas de rações, ao contrário de outras indústrias alimentares, não foram concebidas para facilitar o processo de limpeza e desinfecção das instalações e do equipamento. Para contrariar estas dificuldades, é essencial recorrer a ferramentas de Boas Práticas de Fabrico (BPF) e de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo (HACCP), à gestão de pragas, bem como a parceiros empenhados numa cultura de segurança.

Tabela 1. Frequência de amostras positivas para serovares de Salmonella em fábricas de rações.

Área Amostras positivas, %
Matérias primas embaladas 0,00
Matérias primas a granel 4,17
Transportes 12,20
Incrustrações dos transportes 2,27
Moínho 2,70
Misturadora 6,67
Extrusora 0,00
Peletizadora 0,00
Ração composta 2,50
Pó do pavimento 9,68
Resíduos (scraps) 3,81

Fonte: Pellegrini et al, 2015.

As principais ferramentas para o controlo de microrganismos patogénicos nos alimentos para animais devem centrar-se principalmente na prevenção da entrada de contaminação na instalação, bem como na redução da multiplicação microbiana dentro da fábrica e na eliminação de potenciais agentes patogénicos nos alimentos para animais através de tratamentos físicos ou químicos.

Tratamento físico

O processamento das rações inclui basicamente a trituração, a mistura e, em alguns casos, tratamentos térmicos e sob pressão, como a extrusão, a expansão e a granulação. De acordo com Davies & Wales (2013), estes processos são capazes de reduzir substancialmente a carga microbiana das rações (quadro 2).

Tabela 2. Contaminação microbiológica das rações por tratar e tratadas termicamente.

Farinha por tratar (20ºC) Expander (120ºC)
Microorganismo Saída Expander Saída prensa
Aerobios mesófilos UFC/g 6,7 x 10⁷ 3,30 x 10⁵ 1,60 x 10⁵
Coliformes UFC/g 1,00 x 10⁴ < 10 < 10
E. coli UFC/g 1,00 x 10³ < 10 < 10
Fungos UFC/g 3,00 x 10² < 10 < 10
Salmonella (UFC/25 g) Ausência Ausência Ausência

Fonte: CESFAC, 2007.

No entanto, quando são utilizados processos térmicos, é necessário ter em conta uma série de pontos de controlo para minimizar o risco de recontaminação das rações (quadro 3).

Tabela 3: Pontos de controlo para minimizar riscos de re-contaminação depois dos tratamentos térmicos.

Pontos de controlo
Manter a actividad da água da ração < 0,65%, máx. 0,70%
Manter a diferença de temperatura granulo x ambiente < 5°C, máx. 10ºC
Não usar ar contaminado para arrefecimento e secagem
Restringir acesso à área de tratamento térmico
Ter equipamentos/silos/camiões adequados para limpeza e desinfecção desde a fábrica ao comedouro

Fonte: Klein, 2020.

Outro ponto importante para a segurança das rações é o controlo das pragas. Para isso, podemos utilizar ferramentas como os apanhadores de insectos com luz UV, armadilhas mecânicas para roedores, ultra-sons, barreiras eléctricas, etc., que são muito interessantes para evitar a utilização de insecticidas químicos.

Tratamento químico

Uma das estratégias mais utilizadas para a sanitarização dos alimentos para suínos é a utilização de ácidos orgânicos. Os mais utilizados são os ácidos fórmico, propiónico e láctico (quadro 4). Os ácidos orgânicos não dissociados têm a capacidade de atravessar a membrana celular das bactérias (principalmente Gram -) e de se dissociar no interior do citoplasma, alterando o pH interno e, por conseguinte, as suas funções metabólicas, acabando por provocar a sua morte.
Tabela 4: Concentrações mínimas inibitórias de diferentes ácidos contra diferentes bactérias.

Concentração mínima inibitória (g/kg)
Bactéria Fórmico Propiónico Láctico Sórbico
Salmonella Typhimurium 1,00 1,50 3,00 -
Pseudomonas aeuroginosa 1,00 2,00 3,00 -
Escherichia coli 1,50 2,00 4,00 5,00
Staphylococcus aureus 1,50 2,50 2,50 5,00
Listeria monocytogenes 1,00 2,00 2,50 -
Campylobacter jejuni 1,00 2,00 3,00 -
Clostridium botulinum 1,50 2,50 3,00 -
Clostridium perfringens 1,00 2,50 3,00 -

Fonte: CESFAC, 2007.

A aplicação destes compostos pode ser efectuada à entrada da fábrica sob a forma de nebulização sobre as matérias-primas. O objectivo é tratar a matéria-prima antes do seu armazenamento e utilização. Esta forma de aplicação é interessante quando se utilizam produtos voláteis. Outro ponto de aplicação pode ser directamente na misturadora, o importante é ter cuidado para que não caiam directamente sobre as pré-misturas vitamínico-minerais, pois isso pode ser prejudicial para a sua estabilidade. Finalmente, há a aplicação pós-aglomerado, que é a mais crítica de todas, pois pode afectar a palatabilidade da ração.

Para controlar as micotoxinas, podem ser utilizados produtos adsorventes de micotoxinas e, adicionalmente, produtos que melhoram a saúde intestinal, como prebióticos e probióticos, bem como protectores hepáticos, uma vez que o fígado é o principal responsável pela desintoxicação no organismo.

Novas alternativas

O crescimento da população está a aumentar o consumo de produtos à base de carne em todo o mundo. De acordo com a FAO, o consumo global de carne aumentará 14% até 2030. Ao mesmo tempo, nos países onde a utilização de antimicrobianos como factores de crescimento ainda não foi proibida, há uma pressão crescente por parte dos organismos públicos e dos consumidores devido à possível resistência que a sua utilização pode gerar. Por conseguinte, é necessário procurar novas alternativas para atenuar o risco biológico de contaminação dos alimentos compostos para animais e, consequentemente, melhorar a saúde animal.

Uma alternativa possível poderá ser a utilização de antimicrobianos naturais de origem vegetal (quadro 5), como alguns óleos essenciais e compostos fenólicos que têm demonstrado resultados promissores no controlo de microrganismos patogénicos, tanto gram negativos como gram positivos (Vallejo et al., 2020; Giuliani et al., 2021; Ponce et. al.,2022). Para além disso, estas substâncias demonstraram um efeito antioxidante e antifúngico significativo (Nehme et al., 2021).

Tabela 5: Propriedades antimicrobianas de alguns óleos essenciais. (+: possui efeito antimicrobiano)

Propriedades antibacterianas de óleos essenciais e sensibilidade das bactérias patogénicas
Microrganismo patogénico Canela Alho Pimenta negra Árvore de chá Lavanda Orégão Menta Salva Tomilho
Clostridium botulinum + + +
Enterococcus faecalis + + + + + + + + +
Salmonella typhimurium + + + + + + + + +
Escherichia coli + + + + + + + + +
Yersinia enterocolitica + + +
Pseudomonas aeruginosa + + + + + + + + +

Fonte: Mucha et al. (2021).

Desta forma, podem não só ser uma alternativa para uso directo nos animais, mas também na conservação de alimentos e matérias-primas, aumentando assim o seu prazo de validade e reduzindo o risco biológico de contaminação dos animais com microrganismos patogénicos.

Conclusão

O impacto da segurança dos alimentos para suínos não afecta apenas a saúde, o bem-estar e a produtividade dos animais, mas também toda a cadeia alimentar e a saúde pública. É nossa responsabilidade garantir a segurança das rações e devemos utilizar todas as ferramentas ao nosso dispor para o fazer.

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