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Caso clínico: Intoxicação por monóxido de carbono

As intoxicações nas explorações são, normalmente, situações graves nas explorações. Neste caso a intoxicação foi por monóxido de carbono

11 Maio 2009
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Descrição da Exploração



Este caso aconteceu numa exploração de ciclo fechado situada na zona noroeste de Espanha. A exploração tem aproximadamente 450 porcas reprodutoras. A reposição é externa e os animais de reposição que chegam têm uma idade de cerca de 6-7 meses. O pavilhão de adaptação está dentro da própria exploração, pelo que não existe um pavilhão de quarentena como tal. O desmame é aos 21 dias, momento em que os animais se movem para as salas de baterias (há 4 no total), onde permanecem durante um período de 2 a 3 semanas em função do número de partos previstos. Posteriormente passam para uma pré-engorda que também consta de 4 salas e que se enche com 2 salas de baterias. Ali permanecem umas 4 semanas para passar a uma das 6 engordas que estão na exploração. Cada engorda por sua vez enche-se com duas salas da pré-engorda. Há portanto uma evidente mistura de idades ainda que sem chegar a ser a típica engorda de um ciclo fechado em que os animais de 20kg estão junto com os animais que estão para ir para o matadouro. As engordas não se enchem de novo até que fiquem totalmente vazias, limpas e desinfectadas.

A exploração é positiva à maioria das doenças conhecidas ainda que, desde o ponto de vista sanitário, costuma ser bastante estável sem apresentar grandes problemas de tipo respiratório, contudo observa-se algo mais problemático a nível digestivo. Cada verão aproveita-se para fazer despopulações parciais. A planta da exploração teria um desenho similar ao seguinte:



Aparecimento do Caso e Primeira Visita



Este caso deu-se em finais de Dezembro. A primeira visita entrava dentro das visitas de rotina que se fazem à exploração. Tudo estava, mais ou menos, dentro da normalidade desta exploração salvo que os dois últimos lotes desmamados não apresentavam um bom aspecto. Não havia mortalidade, tão só tinham passado 2 e 5 dias respectivamente desde o dia dos últimos desmames, pelo que se deu uma importância relativa ao tema. Os animais dispunham de água e estavam com uma ração lactoiniciadora medicada com amoxi 300ppm, óxido de zinco 2500 e colistina 120ppm. Aconselhou-se o encarregado que os acompanhasse em cima para que se piorassem pudesse avisar o veterinário, em caso de que acontecesse. Assumiu-se que o mais provável é que podia dever-se a que tivessem passado algum frio, que não tivessem tido acesso à água ou…. É por isso que se insistiu nestes factores para corrigir qualquer deficiência. Ao fim de dois dias o encarregado volta a telefonar dizendo que os animais não melhoram e parece que não comem.


O quadro é o típico em que alguns animais ficam atrasados ainda que surpreenda a rapidez com a que o fazem tão pouco tempo após o desmame. Os animais estão apáticos, magros e é evidente que o consumo de ração é praticamente nulo.


Medidas Preliminares Tomadas



Na segunda visita e após observar os animais com o aspecto anteriormente descrito (aproximadamente 60-70% afectados) decide-se instaurar uma medicação na água com amoxicilina e aspirina. Assume-se que se o consumo de ração não é o adequado, (neste caso como comentámos era praticamente nulo), logicamente não estarão a receber via ração a quantidade de medicação esperada e que portanto, segundo o nosso critério, é muito provável que algum quadro clínico compatível com um H. parasuis esteja a afectar os animais. De qualquer forma, insta-se o encarregado que trate os animais mais afectados via parenteral com ceftiofur e um AINE. Continua-se a observar que os animais não apresentam uma alta mortalidade mas vão ficando atrasados e algo pálidos.

Pelo historial da exploração e pela sintomatologia o quadro era compatível com um Glasser ainda que de aparecimento um tanto precoce.

Após esta segunda visita, fica-se à espera dos resultados que pudessem dar a medicação na água.


Evolução do Caso



A terceira visita produz-se como consequência do telefonema do encarregado da exploração onde expõe que as 4 salas de baterias estão todas a sofrer do mesmo problema. De novo o quadro é o mesmo se bem que algumas das salas pareçam estar mais afectada ainda que não haja uma patocronia clara. Com efeito, a sala mais afectada era onde estava o segundo dos quatro lotes desmamados e não parecia ter uma evolução positiva que pudesse fazer pensar que a medicação instaurada estivesse tendo qualquer êxito. Revê-se de novo toda a exploração prestando especial atenção às maternidades prontas a ser desmamadas e à zona da pré-engorda que é para onde vão os animais depois de passar pelas baterias. Em ambos casos a situação é correcta e os animais não apresentam nenhum tipo de problema respiratório, nem digestivo, nem sistémico. Centramo-nos pois na zona das baterias e decidimos recolher amostras de sangue para analizar uma possível virémia por PRRS nos leitões. A ideia não é que tenha uma grande base dado que anteriores problemas devidos ao PRRS nesta exploração tinham apresentado sintomatologias muito distintas à observada até ao momento com uma mortalidade evidente, sinais respiratórios e tipicamente infecções secundárias na forma de Glasser.

Recolhem-se 15 amostras dos animais mais afectados.

As análises de sangue mostram claramente que não nos encontrávamos ante um problema por PRRS. Os resultados obtidos foram os seguintes:


A sintomatologia e o diagnóstico diferencial deixa-nos com um quadro que naquele momento crêmos que tão só é compatível com um caso de eperytrozoonose. Esta possibilidade entrou dentro do nosso diagnóstico diferencial já que os animais eram leitões desmamados que estavam anémicos, apáticos e inclusive alguns ictéricos e, nalguns casos, apresentavam os bordos das orelhas afectados e com coloração. Quase sempre os surtos de eperytrozoonose produzem-se após alguma situação de stress (desmame, mudança de alojamento) e sobretudo após algumas infecções víricas como por exemplo PRRS.

Ainda que seja uma doença pouco diagnosticada nas nossas explorações (por desconhecimento ou por se apresentar de modo subclínico), a teoria indica que um tratamento com tetraciclinas é de eleição, assim que se decidiu instaurar uma oxitetra via parenteral e uma doxi via oral. A mortalidade observada era devida, na sua maior parte, a que alguns animais tivessem que ser sacrificados devido à sua má condição corporal. As necropsias realizadas no campo não ofereciam mais dados que os aparentes macroscopicamente, ou seja, animais desnutridos, pálidos, alguns ictéricos e tão só devemos realçar o comentário de que o sangue era de uma cor encarnado intenso. Na imagem observa-se um animal separado do resto para mostrar o quadro típico: palidez, magro,..





Resolução do Caso



Três semanas após o aparecimento do caso e, ante a falta de resultados, decide-se que outra pessoa da empresa realize uma visita enquanto se preparam leitões para enviar ao laboratório para um estudo anatomo-patológico.

A visita desta pessoa deu com a solução de forma inesperada. Com toda a informação disponível até ao momento na mão, visita a exploração e em concreto as baterias. Poucos minutos após ter visitado as baterias queixou-se de mau estar, dor de cabeça e má disposição. Para o encarregado, a temperatura era a adequada, coisa que era verdade pois era próxima aos 30ºC no caso dos recém desmamados. Para a pessoa que tinha seguido o caso o ambiente estava algo "carregado" e numas salas mais que noutras. Mas nenhum deles se queixou de mau estar nem de dor de cabeza nem vómitos. Estes são sintomas que costumam dar-se ante um problema de má combustão que geram intoxicações por CO. As salas de baterias aqueciam-se com painéis utilizados na avicultura que funcionam com gás propano. Estas placas enchem-se de pó e isto faz com que a combustão seja deficiente. Ao estar em finais de Dezembro, nas salas de baterias os sistemas de ventilação estavam no mínimo, em muitos momentos inclusive parados.



Nesta exploração além do mais, as condições destes painéis eram bastante pobres e o seu desenho claramente obsoleto na maioria dos casos. Dado que a tomada de ar estava na parte superior, o pó que cai por gravidade deposita-se na referida tomada de ar evitando uma boa combustão.

Rapidamente se decidiu forçar o sistema de ventilação aumentando a ventilação mínima e comprovar os níveis de CO mediante tubos de medição de gás.


A resposta fui imediata. Poucos minutos após os animais começaram a mostrar um comportamento muito mais activo do que tinham tido até ao momento.

Quando obtivemos as leituras das medições, os níveis foram variáveis desde as 50 até às 200ppm. Supomos que o tempo transcorrido entre o forçar a ventilação (primeira prioridade) e ver os níveis de CO ajudou a reduzir os ditos níveis. A bibliografia diz-nos que os diferentes níveis de CO causam sintomatologia diversa. Assim temos que:

>120ppm
tolerável durante algumas horas
aumento de nascidos muortos
>200ppm (afectam a absorção de oxigénio)
apatia
dispneia
paralisia
>1000ppm
possíveis falecimentos

Níveis de 50ppm não são estranhos e sugerem uma ventilação deficente. Há que ter em conta que os níveis em zonas de montanha, ou seja ar puro, são de 0,02ppm e que em cidades com muito tráfego chega até às 40ppm. Tendo em conta estas premissas, supomos que as salas mais afectadas chegaram a níveis bastante superiores às 200-300ppm.

Comentários



Segundo o nosso critério, este caso demonstra que as coisas raras ocorrem com muito pouca frequência e que, muito frequentemente, passamos por alto as coisas mais básicas, seguramente devido a trabalhar com demasiada pressão pelos resultados.

O aparecimento do caso deu-se numa exploração de ciclo fechado situada na zona noreste de Espana, onde se desmama 1 ou 2 vezes por semana segundo o número de partos. Os animais são enviados para as baterias (1 sala-1 desmame) para ao fim de 2-3 semanas passar posteriormente a uma pré-engorda e daí para as engordas. Estas engordas não funcionam segundo um TD-TF estrito mas o que se mantém de maneira muito estrita é que não se voltam a encher até não ficarem totalmente vazias. O quadro em questão deu-se nos animais das baterias e aproximadamente aos 3-4 dias depois de sua chegada, ainda que à medida que passavam os dias, se viam mais afectados. A sintomatologia era de animais que ficavem apáticos, atrasados, magros, pálido/amarelados, sem tosse nem problemas digestivos aparentes. A mortalidade não era muito marcada, apenas alguma baixa esporádica, e as necropsias iniciais tampouco forneciam alguma informação adicional que permitisse poder ter um diagnóstico muito claro excepto o detalhe de que o sangue era de uma cor peculiar, encarnado muito intenso.

Ante esta situação as medidas tomadas inicialmente foram as típicas ante um possível problema de H. parasuis não muito agressivo com uma medicação na água com aspirina e amoxicilina. Ao mesmo tempo decidiu-se tratar os animais mais afectados via IM. com ceftiofur e um composto multivitamínico em especial na sala que estava mais afectada. Tampouco se descartava a possibilidade de que se tratava de leitões virémicos ao PRRS ainda que normalmente nestes casos a mortalidade costume ser bastante mais elevada e a sintomatologia é algo diferente.

A evolução do caso não foi muito boa com estas medidas. As dúvidas surgem e pensa-se em mudar várias coisas ao mesmo tempo. Primeiro verificou-se que não haviam problemas de dosificação dos produtos e decidiu-se aumentar a concentração ante a suspeita confirmada de que o consumo de água era muito menor que o esperado. Também se mudou a ração ao ver que o seu consumo era praticamente nulo. Além do mais, a sala que estava mais afectada continuava a ser a mais afectada, ou seja, não tinha havido nenhuma modificação de qualquer tipo que tivesse modificado as condições iniciais. Esta falta de evolução levou a pensar em problemas mais raros que pudessem ter esta sintomatologia durante este periodo pós-desmame e foi assim como se suspeitou de uma eperitrozoonose, dado que esta se produz após alguma situação de stress como é a mudança de alojamento) e sobretudo após infecções víricas prévias (PRRS). Por isso os animais trataram-se com uma oxitetra via parenteral e uma doxi oral.

Finalmente a resolução do caso foi muito diferente de todas estas suspeitas. A visita de outro técnico às instalações, ante a pouca evolução do caso e para ter uma visão nova (o que a nosso modo de ver é sempre altamente recomendável), deu com a solução deste caso. Este técnico, que trabalha na mesma empresa, detectou um problema na ventilação. Poucos minutos, para não dizer segundos, após ter entrado nas baterias, o técnico notou dor de cabeça, vómitos e mau estar geral, sintomas que indicavam a presença de níveis elevados de CO devidos a uma má combustão dos painéis de gás propano usadas para aquecer as salas.

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