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Caso clínico: Leitoas de um dia de vida como alternativa para adaptação de nulíparas

A adaptação das reprodutoras ao ambiente e microbismo da exploração pode ser bastante agressivo. Uma forma de melhorar a adaptação é usar leitoas de 1 dia

28 Fevereiro 2003
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Descrição da exploração



Exploração de ciclo fechado para 400 reprodutoras, localizada na zona centro do pais, com maneio em bandas semanais, utiliza inseminação artificial proveniente de um centro de inseminação e recebe as futuras reprodutoras com cerca de 100 Kg de p.v. provenientes de uma empresa de genética. Instalações: 1 sala de cobrição com 68 lugares, de construção antiga, com ventilação natural, 1 sala de gestação com 240 lugares, mais recente com ventilação controlada, 90 lugares de maternidade, 8 salas de baterias, 1 engorda afastada da unidade das porcas, 1 quarentena, 1 enfermaria (servia de gestação) e 1 parque de espera próximo do cais de embarque.

As reprodutoras são colocadas numa quarentena junto da exploração onde são vacinadas, antes de entrar na exploração, contra as seguintes doenças:

Parvovirose + Mal Rubro
PRRS
D. de Aujeszky
Rinite Atrófica


Aparecimento do problema



A principal queixa do cliente foi a baixa produtividade da exploração desde que se procedeu ao aumento do efectivo em 1999, e especialmente o aumento significativo das repetições (chegou a 30%), durante o ultimo trimestre de 2000, acompanhada em grande parte por descargas vaginais (DV)e abortos (AB) precoces (menos de 30 dias).

Dados de produtividade fornecidos em relação ao ano 2000
Leitões desmamados por porca produtiva/ano
19,65
Taxa de Partos
74,5%
Media de Nascidos vivos
9,95
Media de desmamados
9,36
IDCF médio
15,6 dias
Partos Porca Produtiva Ano
2,11


Primeira visita a exploração



A exploração foi visitada em Janeiro de 2001 e procedeu-se a seguinte recolha de dados e de informações de maneio:

  • Historial da exploração.
  • Identificação de todas as porcas com problemas reprodutivos, tendo-se registado: o numero de partos, a data da inseminação, o numero do varrasco, a data de ocorrência da descarga ou aborto, a data de retorno ão cio e o numero de retornos de cio anteriores. Registou-se ainda o local da exploração onde estavam alojadas as porcas quando se iniciou a DV ou AB.
  • Acompanhou-se a exploração durante vários dias de realização de detecções de cio / inseminação, para averiguar da qualidade do trabalho do inseminador. Analisaram-se as doses de sémen dos vários varrascos utilizados num laboratório especializado, quanto a qualidade bacteriológica e qualidade/quantidade dos espermatozoides.
  • Colheu-se sangue a 25 porcas de vários partos para sorologia de PRRS, Parvovirus, D. de Aujeszky e Mal Rubro.
  • Colheram-se zaragatoas vaginais de porcas com descargas e enviaram-se ão laboratório para analise bacteriológica.

Resultados



a) Em 1999 a exploração foi ampliada para o seu tamanho actual, tendo recebido porcas multíparas, de vários partos, provenientes de outra exploração que entretanto fechou, pertença do mesmo grupo. O estatuto sanitário destas porcas não é conhecido, e as mesmas representaram um aumento de censo de cerca de 50%. Os dados produtivos desse ano (1999) não são conhecidos na totalidade, embora tenham piorado significativamente em relação a 1998, tendo ultrapassado por pouco os 18 leitões /porca/ano. No ano 2000 reformaram-se uma grande parte das porcas provenientes da exploração que fechou, devido a sua baixa produtividade, tendo-se efectuado uma taxa de reforma superior a 50%, tendo obrigado a introdução de um grande numero de porcas novas. As porcas novas foram fornecidas por uma empresa de genética, sendo sanitariamente seguras.

b) As porcas mais afectadas são as de 1º,2º, 3º e >=8 partos. As descargas vaginais apareciam cerca de 16 a 18 dias depois da inseminação, e o retorno ao cio cerca de 5 dias depois disso. Existia um numero variável de porcas que abortava entre os 25 e os 30 dias, entrando estas em cios cerca de 5 dias depois.

Descargas vaginais purulentas em porca com 18 dias de gestaçao


c) Os retornos de cio são maioritariamente aos 21-23 dias (38,41%), existindo cerca de 17,58% de retornos adicionais entre os 24-27 dias.

d) Os problemas de DV / AB só apareceram na sala de cobrições velha, e sobretudo numa das filas, junto a parede Sudoeste do edifício, onde as janelas estavam avariadas, na sua maioria, deixando entrar alguma corrente de ar frio.

e) As detecções de cio parecem ser feitas correctamente, embora o controlo de cio aos 21 dias não o seja (não usa o varrasco). O inseminador é experiente, e insemina razoavelmente.

f) O sémen dos varrascos só é entregue 2 vezes por semana, embora as doses analisadas apresentem uma qualidade normal, nas 2 vertentes pesquisadas. A estufa de conservação do sémen funciona bem e mantém uma temperatura de 16º C.

g) As sorologias efectuadas revelaram que algumas das porcas mais velhas tem anticorpos (AC) para PRRS (títulos médios) e D. de Aujeszky GE+. As porcas nuliparas, são negativas a AC para estas doenças. Em relação às outras doenças os títulos encontrados são normais para explorações vacinadas, embora as porcas com 1-3 partos apresentassem títulos altos de AC para Parvovírus.

h) Das zaragatoas vaginais foi isolado E. Coli e Staphilococcus sp.

i) Dados adicionais: As porcas novas de substituição entram na exploração negativas a AC das doenças acima mencionadas. Quando chegam, são colocadas na "quarentena", onde permanecem cerca de um mês para efeitos de vacinação, sendo depois mudadas para os parques da sala de cobrições velha. Quando fazem cio, são inseminadas e colocadas na linha de celas, junto com as outras porcas. Não se fazia maneio de adaptação algum durante a quarentena.

A sala de cobrição velha está sempre bastante húmida e suja, sendo limpa apenas em dias alternados, sendo habito dar uma "mangueirada" de agua na traseira da porca a seguir a remoção das fezes. As porcas com DV ou AB são mudadas de local, para a fila em frente aos varrascos, e o seu lugar é limpo, sendo aí colocada outra porca.

Medidas tomadas



Foi estabelecido um programa de actuação com varias frentes, para tentar resolver o problema num período de 6-12 meses.

a) Introdução do máximo número de reprodutoras na quarentena, onde permanecerão por 10 semanas. Correcta vacinação e adaptação ao microbismo da exploração, por exposição controlada a material biológico da exploração (fezes de porcas velhas, contacto nasal com porcas de refugo sem DV / AB).

b) A seguir a esta introdução de animais, não entram animais adultos na exploração durante um mínimo de 6 meses.

c) Introdução de 10 leitoas F1 de um dia de vida, provenientes da outra exploração do mesmo dono com porcas "GP", uma vez por semana, sendo adoptadas em 2 ou 3 porcas da maternidade, de modo a garantir que daí a 6 meses teremos porcas de substituição criadas na exploração, e devidamente adaptadas ao seu microbismo.

d) Modificação do parque de espera junto do cais de embarque, de modo a transforma-lo numa zona de cobrição para porcas nulíparas, para que a sua introdução na gestação junto das outras porcas seja feita com o máximo de dias de gestação possível, e somente para dentro da sala de gestação mais nova. Estas porcas não passam na sala de cobrições velha.

e) Organização do povoamento das salas de cobrição e gestação colocando as porcas do mesmo grupo em 2 filas "traseira com traseira", em vez de ser em filas seguidas, para evitar infecções por via ascendente. Povoamento "por zona" em detrimento de "por fila".

f) Reparação das janelas e sistema de ventilação da sala de cobrições velha. Colocação de iluminação extra controlada por um relógio de modo a fornecer 14 horas de luz abundante por dia. (06h00 - 20h00)

g) Limpeza das fezes das porcas todas ( sala de cobrições, gestação, maternidade) duas vezes por dia, sendo posteriormente espalhado "Biosuper" por detrás das porcas, uma vez por dia, de modo a desinfectar e secar o pavimento onde se deitam os animais. Colocação de desinfectante nos pediluvios entre compartimentos da exploração).

h) Todas as porcas com 7 ou mais partos, e que façam DV abundante ou abortem, são enviadas para o matadouro. O mesmo acontece com as porcas com 3 falhas sucessivas.

i) Medicação da ração das porcas com antibióticos bacteriostáticos em doses baixas (sulfa+tetras+tmp) por períodos de 6 semanas, para permitir reduzir a pressão de infecção sem matar todas as bactérias, de modo a estabelecer-se resposta imunitária adequada.

Interpretação do problema



Este caso pareceu-nos ser um problema de falhas reprodutivas causadas por DV e AB, originados por uma conjugação de vários factores:

  • A entrada abrupta de porcas multiparas de estatuto sanitário desconhecido em 1999, aumentando o censo da exploração e a pressão de infecção, seguida da entrada em grande numero de porcas novas de elevado estatuto sanitário (altamente susceptíveis), sem quarentena e adaptação apropriadas.
  • A manutenção de uma zona de cobrições sem condições de higiene nem de ambiente (temperatura, humidade e correntes de ar) apropriados, onde todas as porcas são inseminadas e contaminadas.
  • Falta de conhecimento de boas praticas de limpeza e higiene por parte dos trabalhadores.
  • A introdução precoce das porcas nuliparas no programa de reprodução para compensar o aumento dos retornos de cio, de modo a manter o mesmo numero de partos por mês.
  • A coincidência da estação do ano (Outono) com a progressiva incidência do fotoperíodo decrescente.

Seguimento do caso



O dono da exploração acedeu a executar o plano proposto na totalidade e seguindo o protocolo recomendado.

Construi-se a nova zona de cobrição de nuliparas, e iniciou-se a transferencia de leitoas F1 de um dia de vida provenientes da outra exploração. (A taxa de mortalidade real destas leitoas ( dos 0 aos 150 dias) foi de apenas 10%. Só se transferiram as leitoas depois destas terem mamado o colostro na mãe biológica. Escolheu-se como mãe adoptiva uma porca que tenha parido no mesmo dia, e onde as leitoas vão mamar uma 2ª dose de colostro, na exploração de destino.) As leitoas são mantidas na exploração até aos 70 dias de vida sendo depois transferida para uma zona da engorda separada, onde permanecem até aos 180 dias de vida, sendo depois transferidas para a quarentena para vacinação e adaptação à exploração. Houve uma paragem de introdução de reprodutoras durante 6 meses, o que afectou um pouco o censo da exploração.

As porcas que entraram na quarentena, antes de se ter parado com a entrada de animais, foram cobertas já na sala nova, tendo sido atingida uma fertilidade nesse grupo de 93%. Quando passaram para a gestação não houve qualquer aborto. Abateram-se as porcas mais velhas que manifestaram DV ou AB. Os problemas com novos casos de DV e AB reduziram-se significativamente, tendo voltado a atingir-se valores normais de produtividade no final do segundo semestre de 2001:

Dados de produtividade no final do segundo semestre de 2001
Leitões desmamados por porca produtiva/ano
23,25
Taxa de Fertilidade
83,2%
Media de Nascidos vivos
10,80
Media de desmamados
10,22
IDCF médio
10,6 dias
Partos Porca Produtiva Ano
2,28


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Introdução

Esta exploração foi inicialmente um ciclo fechado tradicional de 200 porcas. Em 1999 a exploração foi ampliada para 400 porcas provenientes de outra exploração que entretanto fechou, pertença do mesmo grupo.

A principal queixa do cliente foi a baixa produtividade da exploração desde que se procedeu ao aumento do efectivo em 1999, e especialmente o aumento significativo das repetições (chegou a 30%), durante o ultimo trimestre de 2000, acompanhada em grande parte por descargas vaginais (DV) e abortos (AB).

Este caso clínico iniciou-se no último trimestre do ano 2000, sendo o problema em causa uma situação de falhas reprodutivas associadas a descargas vaginais e abortos precoces, afectando principalmente porcas novas e muito velhas. O problema foi solucionado durante o ano 2001, manteve-se estável até ao Verão de 2002, tendo voltado a surgir com a mesma sintomatologia em finais de Outubro de 2002. Nesta data o problema está em fase de resolução, empregando praticamente as mesmas soluções usadas em 2001.

O controlo do censo da população de porcas de uma exploração, de modo a mantê-lo num estado de equilíbrio ao longo do tempo, é uma das poucas armas que possuímos para nos defendermos do aparecimento de problemas como este. A má programação dos aumentos de efectivo, e a introdução repentina de um elevado número de porcas novas dentro de uma exploração, sem uma adaptação correcta, pode ser o suficiente para desestabilizar a sanidade do efectivo e baixar drasticamente a produtividade.

Exemplo de um censo equilibrado, para duas populações diferentes, uma com porcas até ao 7º parto, e outra com porcas até ao 8º parto. A tabela representa a percentagem ideal de porcas por parto num censo equilibrado.

Nº Parto
% Ideal Pop 7 P
% Ideal Pop 8 P
1
22,1
20,6
2
18,7
17,5
3
16
14,9
4
13,6
12,7
5
11,5
10,8
6
9,8
9,1
7
8,3
7,8
8
6,6
9 ou +


Programa de actuação

Foi estabelecido um programa de actuação com varias frentes, para tentar resolver o problema num período de 6-12 meses:

a) Introdução do máximo numero de reprodutoras na quarentena, onde permanecerão por 10 semanas. Correcta vacinação e adaptação ao microbismo da exploração.

b) A seguir a esta introdução de animais, não entram animais adultos na exploração durante um mínimo de 6 meses. O objectivo é evitar a introdução de animais susceptíveis de multiplicar os agentes causadores do problema.

c) Introdução de 10 leitoas F1 de um dia de vida. As leitoas ao 1º dia de vida, filhas de mães saudáveis, não estão ainda contaminadas pela maioria dos agentes patogénicos existentes na exploração, pelo que são uma excelente alternativa para introduzir genética de alta sanidade noutra exploração.

d) Modificação do parque de espera junto do cais de embarque para que a sua introdução na gestação junto das outras porcas seja feita com o máximo de dias de gestação possível, e somente para dentro da sala de gestação mais nova. O objectivo é evitar o contacto destas porcas com a "zona de contaminação" antes de se ter estabelecido a ossificação dos embriões. Depois desta altura, cerca dos 45 dias de gestação, o risco de abortos ou reabsorções embrionárias já é bastante menor.

e) Organização do povoamento das salas de cobrição e gestação colocando as porcas do mesmo grupo em 2 filas "traseira com traseira", em vez de ser em filas seguidas, para evitar infecções por via ascendente. Povoamento por zona em detrimento de por fila (existe muito o hábito de povoar as gestações seguindo uma ordem fila a fila, permitindo que as zonas traseiras de porcas de diferentes filas, e em diferentes fases de gestação, estejam suficientemente próximas para permitir o contágio de bactérias por via ascendente).

f) Reparação das janelas e sistema de ventilação da sala de cobrições velha. Colocação de iluminação extra.

g) Limpeza das fezes das porcas e aplicação de superfosfato. Colocação de desinfectante nos pedilúvios entre compartimentos da exploração (o objectivo é diminuir a pressão de infecção por bactérias, eliminando as condições favoráveis ao seu desenvolvimento).

h) Eliminar as porcas cronicamente afectadas que são reservatórios da doença.

i) Medicação da ração das porcas com antibióticos bacteriostáticos em doses baixas (sulfa+tetras+tmp) por períodos de 6 semanas, alternados com descanso de 3 semanas, para permitir reduzir a pressão de infecção sem matar todas as bactérias, de modo a estabelecer-se resposta imunitária adequada.

Técnica de transferência de leitoas com um dia de vida

1- Programar partos nas 2 explorações para o mesmo dia, sendo melhor provocar partos de manhã na exploração dadora e de tarde na exploração receptora.

2- Deixar as leitoas mamar colostro na mãe biológica durante pelo menos 3 horas.

3- Preparar uma caixa isolada termicamente (esferovite, poliuretano, etc) com palha de papel dentro, e com vários furos na tampa. Capacidade para 10 leitoas.

4- Certificar-se que os partos na exploração de destino já começaram, antes de partir com as leitoas da exploração de origem.

5- Escolher as porcas paridas com melhores tetos (2º, 3º partos, tetos longos e finos, colocados mais próximo da linha média) e retirar 4 ou 5 leitões maiores para outras porcas.

6- Adoptar as leitoas, nas porcas, ajudando-as a mamar colostro pelo menos 2 vezes no primeiro dia. Cortar dentes e rabos só no final do dia seguinte, depois de ter a certeza da adaptação das leitoas à nova mãe. Se necessário retirar mais algum leitão para outra porca para dar espaço às leitoas.

7- Ao desmame colocar as leitoas todas juntas num parque, com uma área de >= 0,40 m2 por leitoa.

8- Ao passar para a engorda respeitar a área de 1 m2 por porca.

9- Aos 165 dias de vida mudar as porcas para a quarentena da exploração para serem vacinadas e adaptadas, durante um período mínimo de 6 semanas.

Os problemas com novos casos de DV e AB reduziram-se significativamente, tendo voltado a atingir-se valores normais de produtividade no final do segundo semestre de 2001:

Conclusões

Este caso parece justificar por si só a importância da programação criteriosa dos aumentos de efectivos e da introdução de grande número de porcas nuliparas dentro de uma exploração. A adaptação das futuras reprodutoras à exploração de destino é hoje uma das normas mais importantes para a manutenção do equilíbrio sanitário dos efectivos. O equilíbrio entre saúde e doença nas explorações mais antigas é uma linha muito estreita, que se altera com muita facilidade. Não podemos esperar que por sorte ou por intervenção divina, os problemas só apareçam nas explorações do vizinho, quando provocamos a sorte tão descaradamente.

Mesmo uma exploração em equilíbrio, pode perdê-lo de um mês para o próximo. Isto foi o que voltou a acontecer na mesma exploração em finais de Outubro de 2002, tendo ocorrido um novo surto de DV e AB, tal como em 2000. Logo que os resultados melhoram, há a tendência de facilitar e isso revela-se fatal nestas situações.

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