O dramaturgo ateniense Aristófanes escreveu certa vez: "É com os seus inimigos, não com seus amigos, que as cidades aprendem a lição de construir muros altos e barcos de guerra". Embora a citação original fale da defesa de uma cidade-estado contra o ataque inimigo, também pode ser aplicada para protecção contra uma doença infecciosa. Os cientistas há muito que estudam e aprendem sobre vírus, bactérias e parasitas para nos proteger melhor contra doenças. Graças a isso, foram descobertas vacinas e, desde então, a investigação e o trabalho continuam, de forma a desenvolver e melhorar as vacinas. Em porcos, a vacinação é parte integrante do plano de manutenção da saúde suína. Como consequência, muitas vezes surgem dúvidas sobre as vacinas e a sua interacção com o sistema imunológico. Este artigo responde a algumas delas com informações de estudos científicos relevantes.
É importante conservar as vacinas a uma temperatura de armazenamento adequada? A vacina pode falhar se não for conservada a uma temperatura adequada?
Geralmente as vacinas consistem em organismos infecciosos (vírus ou bactérias) atenuados (enfraquecidos) proteínas ou ácidos nucléicos (DNA ou RNA), os quais podem ser inativados ou destruídos por mudanças na temperatura, luz ou pH. Manter a vacina a uma temperatura adequada, muitas vezes referida como “cadeia de frio”, é muito importante para garantir a sua estabilidade e eficácia. Por exemplo, um estudo de 2011 sobre o vírus da gripe mostrou que a incubação desse vírus a 50 graus Celsius (122 ° F) por 30 minutos resultou numa redução de 100 vezes no vírus infeccioso (Krenn et al). Flutuações de temperatura simplesmente por aberturas frequentes ou mau funcionamento do frigorífico podem ser prejudiciais à potência da vacina. Além do calor, o congelamento pode ser prejudicial à sua estabilidade, dependendo da vacina. Por isso, é importante ler e seguir os cuidados listados no rótulo da vacina (figura 1) e verificar os prazos de validade.
É muito difícil determinar quantas vacinas falham apenas devido à incapacidade de manter a temperatura ideal, pois existem várias causas potenciais de falha da vacina, incluindo, mas não se limitando a: contaminação bacteriana de frascos multiuso, desinfecção química de seringas ou agulhas que inativa a vacina, ou administração pela via errada (intramuscular vs. oral). É importante entender a diferença entre a falha percebida da vacina e a falha real. Um exemplo de falha de vacina percebida ocorre quando um animal já está infectado com um agente infeccioso no momento em que é vacinado contra esse mesmo agente. O animal desenvolve a doença e a vacina é responsabilizada por ser ineficaz quando, na verdade, simplesmente não havia tempo suficiente para a vacina induzir uma resposta imune protectora.
As vacinas podem ser misturadas numa só injecção?
Não é uma boa prática combinar vacinas cujos rótulos não indicam que podem ser misturadas, pois vacinas diferentes podem ter incompatibilidades relacionadas a pH, solubilidade, adjuvantes ou conservantes. Além disso, a mistura inadequada de vacinas vivas atenuadas pode afectar a viabilidade do organismo da vacina. No entanto, existem combinações autorizadas com antigénios ou agentes específicos para diferentes agentes patogénicos nos quais sua compatibilidade e ausência de interferência foram avaliadas.
Quantas vacinas podem ser administradas de forma segura ao mesmo tempo?
Não há uma resposta definitiva, pois há uma grande variabilidade entre as vacinas. No entanto, deve-se ter cuidado ao administrar várias vacinas ao mesmo tempo, pois elas não são testadas juntas quanto à segurança e eficácia e, como resultado, não está claro como diferentes organismos, antigénios e adjuvantes irão interagir ou modular a resposta imunitária. Se várias vacinas forem administradas ao mesmo tempo, a administração de vacinas no mesmo local anatómico deve ser evitada injetando-se uma vacina no lado esquerdo do pescoço e a outra no lado direito. Se isso não for possível, recomenda-se a administração em diferentes pontos da mesma região anatómica do pescoço. Isso pode ajudar a prevenir a mistura da vacina no mesmo local de injecção. Além disso, ao injectar vacinas num animal, é importante entender onde é anatomicamente seguro fazê-lo. Por exemplo, uma injecção muito perto da coluna pode causar compressão ou danos à medula espinhal, levando à paralisia.
A frequência da vacinação influencia a resposta imunológica?
Após a vacinação, células específicas do corpo produzem anticorpos contra as proteínas (antigénios) da vacina. Os anticorpos são importantes para a ligação e neutralização de agentes patogénicos. No entanto, o sistema imunitário também desenvolve uma resposta de memória contra os antigénios. Consiste em células de memória semelhantes a sentinelas que circulam por todo o corpo em busca de seu antigénio específico. Se encontrarem esse antigénio, proliferam e rapidamente começam a produzir anticorpos que ajudam a aumentar o título de anticorpos circulantes. A esse reforço da resposta imunitária foi dado o nome de "dose de reforço", que é a administração adicional de uma vacina após uma dose anterior.
Tal como a resposta do anticorpo, as células de memória levam pelo menos duas semanas para se desenvolver após a vacinação, por isso é aconselhável esperar pelo menos duas semanas entre as vacinas de reforço. Os rótulos das vacinas geralmente indicam se uma dose de reforço é necessária, no entanto, recomenda-se consultar o veterinário para desenvolver um protocolo de vacinação eficaz.
Existe alguma diferença na resposta imunitária segundo onde for injectada a vacina (pescoço vs. flanco)? Um local é melhor que o outro?
Podem ser encontradas, na literatura científica, diferenças na imunidade dependendo do local da injecção. O pescoço é o local autorizado para vacinar, já que a injecção no flancobpode prejudicar uma parte muito valiosa do porco. Não há diferença conhecida na resposta imunitária, dependendo de que lado do pescoço é vacinado.
As vacinas sem agulha geram o mesmo nível de imunidade que as injeções intramusculares?
Vários estudos foram conduzidos comparando esses diferentes métodos de administração, e o consenso geral é que não há diferença significativa na imunidade gerada entre a administração da vacina por via intramuscular versus a administração sem agulha. A administração sem agulhas também traz benefícios, como a eliminação de agulhas quebradas e picadas acidentais (Chase et al. 2008).
Ferrari et al (2011) compararam os títulos de anticorpos neutralizantes de vírus entre suínos vacinados por via intramuscular (IM), intradérmica (ID) sem agulha e o grupo controlo (Figura 2). No estudo, há uma diferença pequena, mas não estatística, nos títulos de neutralização entre a administração de vacinas sem agulha e IM. Uma diferença estatística é mostrada entre ambos os grupos vacinados e o grupo de controlo não vacinado. Além disso, há um rápido aumento nos títulos de anticorpos neutralizantes em ambos os grupos vacinados após a vacinação de reforço.
As futuras vacinas terão métodos de administração diferentes (água, alimentos, aerossol)?
Já foram explorados e aplicados vários métodos de administração em algumas espécies. Em suínos, faz sentido, em termos de facilidade de administração e geração de protecção imunológica, aplicá-lo em locais anatómicos onde os agentes patogénicos infectam e causam doenças. Por exemplo, alguns agentes patogénicos infectam apenas o trato gastrointestinal, então foram desenvolvidas vacinas orais que estimulam as células imunitárias dentro do trato GI a produzir imunidade no local da infecção.