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Número necessário para tratar (NNT) e suas implicações no campo

Como determinamos a relevância clínica? Uma forma é analisar quantos animais deverão ser tratados para obter um resultado positivo. Isto é o que nos permite definir o número necessário para tratar (NNT).

Todos os trabalhos de investigação de qualidade requerem a apresentação dos cálculos estatísticos. Um dos termos estatísticos a que se dá muita atenção é o valor P. O valor P mostra a probabilidade de que o resultado obtido seja fruto da simples casualidade. Noutras palavras, utiliza-se para estabelecer se um resultado é estatísticamente significativo ou não. Trata-se de um cálculo valioso, mas não nos diz nada sobre a importância clínica dos resultados. Assim, como avaliamos a relevância clínica? Uma forma é a determinação do número de indivíduos que necessitam receber o tratamento para obter um resultado mais favorável. Este é o conceito que há por trás do número necessário para tratar (NNT). Um NNT=1 significa que uma intervenção produzirá um efeito de 100%. Ou seja, que cada indivíduo tratado terá um resultado positivo, enquanto que cada indivíduo não tratado terá um resultado negativo. A fórmula do NNT é:

NNT = 1 / ARR
ou
NNT = 1 / (EER - CER)

ARR = Redução absoluta do risco (EER – CER)
EER =
Taxa de eventos no grupo experimental
CER = Taxa de eventos no grupo controlo

Para calcular o NNT são necessários resultados que possam apresentar-se como uma proporção (ou seja, uma percentagem). O NNT pode calcular-se facilmente a partir de muitos estudos se se fornecem os dados em bruto. Mesmo assim, se os resultados são dicotómicos (ou seja, que se podem dividir em duas categorias, como Sim ou Não) também se costuma poder calcular o NNT. Inclusive podem utilizar-se fórmulas especiais ou tabelas para converter uma odds ratio (OR) num NNT. Um NNT não pode ser calculado a partir dos estudos caso controlo porque não há estatísticas disponíveis de incidência/prevalência.

Tratamiento de un lechón

Para entender melhor este conceito vamos utilizar alguns exemplos a partir de dados publicados. Foram eliminados os nomes dos produtos já que o que nos importa neste caso é unicamente o conceito.

Exemplo #1.

Num ensaio de campo em que participaram 533 porcos durante um severo surto respiratório, a percentagem de animais curados foi superior e estatísticamente significativa (P=0,0214) se se utilizava o antibiótico A (189/266; 71,05%) em comparação com o grupo controlo injectado com soro salino (124/267; 46,44%). O ARR = 0,7105 – 0,4644 = 0,2461. Noutras palavras, havia uma diferença de 24,61% no rácio de curados entre os animais tratados com o antibiótico A e os tratados com soro salino. Neste caso NNT = 4 (1 / 0,2461) o que implica que há que tratar 4 porcos com o antibiótico A para obter uma cura extra do que só se injectasse soro salino. Os animais seleccionados tinham uma pontuação respiratória >1 (numa escala de 0 a 3 onde 0 é normal), e/ou uma pontuação de atitude >1 (numa escala de 0 a 3 onde 0 é normal), e uma temperatura rectal de ≥ 104°F (40°C). Os porcos que se ajustavam a estes critérios localizavam-se aleatoriamente nos grupos e o tratamento começava no dia 0. A “cura” definia-se como a sobrevivência ao dia 7 pós-tratamento, com uma temperatura rectal < 104ºF(40°C), com uma respiração e uma atitude normal.

Exemplo #2.

Utilizaram-se um total de 762 porcos de engorda comerciais em 10 estudos. Os animaos provinham de explorações com um historial de surtos respiratórios. Definiu-se surto respiratório como o dia (Dia 0) quando pelo menos 15% dos candidatos de um parque tinham uma pontuação respiratória ≥ 2 (numa escala de 0 a 3, onde 0 é normal), uma pontuação de depressão ≥ 2 (numa escala de 0 a 3, onde 0 é normal) e uma temperatura rectal ≥ 104°F(40°C). Quando o parque atinge o limite de 15%, o resto dos porcos do parque juntavam-se aos grupos de tratamento e tratavam-se com o antibiótico B ou com soro salino. O tratamento classificava-se como tendo êxito quando no dia 7 o porco continuava vivo e com uma pontuação respiratória de ≤ 1, uma pontuação de depressão ≤ 1 e uma temperatura rectal < 104°F(40°C). Neste ensaio, o antibiótico B teve um rácio de êxito superior e estatísticamente significativo (P=0,0188) (198/346; 57,22%) em comparação com os tratados com o soro salino (148/347; 42,65%). A ARR = 0,5722 – 0,4265 = 0,1457 ou uma diferença de curados de 14,57% entre os tratados com o antibiótico B e os tratados com o placebo. Neste caso, NNT = 7 (arredondando para cima de 1 / 0,1457) o que implica que se necessita tratar 7 porcos com o antibiótico B para obter uma cura extra que administrando simplesmente o soro salino.

Exemplo #3.

Utilizaram-se 280 porcos comerciais de 10 semanas de um sítio com historial de pleuropneumonia. Quando parecia iminente um novo surto, registaram-se as pontuações respiratórias e de atitude e a temperatura rectal. Um porco com uma temperatura rectal ≥ 104,0ºF (40°C), frequência respiratória aumentada, respiração trabalhjosa ou dispneica e depressão considerou-se doente e febril. Quando um mínimo de 3 porcos de um parque estavam doentes e febris, o parque entrava no estudo. Considerava-se o tratamento como tendo êxito se o porco tinha uma temperatura rectal < 104,0ºF (40°C), uma respiração normal e pouca ou nula depressão no dia 4. A morbilidade foi significativamente inferior (P<0,0001) no grupo tratado com o antibiótico C (10/137; 7,30%) que nos tratados com o soro salino (71/138; 51,45%). A mortalidade também foi significativamente menor (P=0,0325) nos que receberam o antibiótico C (0/137; 0%) que nos controlo (9/138; 6,52%). A morbilidade ARR = 0,5145 – 0,0730 ou 0,4415 e a mortalidade ARR = 0,0652 – 0 ou 0,0652. Portanto, neste estudo, o NNT da morbilidade foi de 3 (arredondando para cima 1 / 0,4415) e o NNT da mortalidade de 16 (arredondando para cima 1 / 0,0652). Isto sugere que deveriam tratar-se 3 porcos para obter um porco doente menos (morbilidade) enquanto que haveria que tratar 16 porcos para salvar um extra (mortalidade).

O resultado de muitos destes estudos podem parecer surpreendentes. Se, de facto alguns porcos se recuperam independentemente do tratamento seleccionado e, inclusive com os melhores tratamentos, nem todos os porcos terão a resposta desejada. As patologias respiratórias no campo não são causadas por um agente único e, frequentemente, se complicam com outros agentes patogénicos (especialmente virais), factores ambientais (temperatura, humidade). Também dependem do sistema imunitário do próprio animal (que é o principal mecanismo para lutar contra a doença). Ainda que os antibióticos tivessem sido 100% efectivos, requeririam uma identificação e tratamento precoces para terem êxito.

Como para todos os valores estatísticos, é interessante ter um intervalo de confiança (IC) para o NNT. A fórmula para calcular o IC 95% pode ser complexa dependendo do tipo de dados de que se dispõe. Podem encontrar-se vários programas para os calcular na internet. Há que recordar, contudo, que ter o IC ajuda a colocar em perspectiva o intervalo necessário para um resultado mais favorável.

A publicação Bandolier, da Universidade de Oxford sobre Medicina baseada na evidência sugere que na medicina humana o NNT dos tratamentos muito efectivos oscila normalmente entre 2 e 4, enquanto que o uso de medidas profiláticas podem ter NNT maiores. As medidas preventivas costumam englobar situações onde muito poucos pacientes se vejam afectados em populações muito grandes. Actualmente não há recomendações que sugiram valores NNT na veterinária nem para tratamentos nem para prevenção.

Outra vantagem do NNT é que permite calcular o impacto económico de uma intervenção. Conhecendo a diferença de preço entre as duas intervenções, bem como a ARR pode-se calcular quanto tem que se gastar para salvar mais um porco.

Exemplo:
O produto A custa $2,50 por porcdo.
O produto B custa$1,00 por porcdo.
ARR = 17% a favor do produto A
NNT = 6

Isto significa que, com o produto A, necessitam tratar-se 6 animais para salvar mais um porco que com o B. Isto custaria $9,00 extra [6 x ($2,50 – $1,00)] mas o resultado seria um porco vivo a mais. Este cálculo assume que pelo menos se gastaria $1,00 por porco (tratamento base).

Recordemos que NNT baseia-se em resultados específicos em períodos de tempo delimitados. Isto significa que se deve ser muito cuidadoso na hora de comparar tratamentos entre diferentes estudos a menos que sejam tratamentos homogéneos.

Em resumo, NNT é uma ferramenta simples que pode utilizar-se no dia a dia da prática suína. É um modo fácil para explicar estatísticas bem como a relevância clínica de novas intervenções. Também pode simplificar os cálculos de custo-benefício de diferentes intervenções para os nossos clientes.

Nota:

Pontos chave sobre o NNT:

  • Costuma arredondar-se para cima até ao número inteiro mais próximo
  • Matematicamente não pode ser nenhum valor entre -1 e 1
  • Quando ARR = 0 então NNT = ∞ indicando que não há efeito
  • Pode calcular-se um NNT diferente para cada resultado que possa expressar-se como proporção (ou seja, percentagem) dentro de um mesmo estudo
  • Para os tratamentos são melhores os números mais pequenos
  • Para medidas preventivas aceitam-se números maiores
  • O NNT deve indicar-se especificando o efeito e a margem de tempo
  • Só se podem comparar NNT entre diferentes estudos se forem homólogos (mesmos efeitos, nos mesmos períodos de tempo e sob as mesmas condições)
  • Não há que sobre-interpretar o valor de NNT

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