Introdução
Apesar da sua escassa utilização nos programas comerciais de inseminação artificial (IA), apenas em 1% das porcas inseminadas, hoje já ninguém questiona as vantagens, tanto sanitárias como económicas e produtivas, do sémen criopreservado relativamente ao fresco e/ou refrigerado. Vantagens inerentes a que as doses de sémen possam ser conservadas durante anos sumersas em azoto líquido (a -196°C) sem que seja prejudicada a qualidade espermática (Figura 1). Assim, permite avaliar a presença de agentes patogénicos nas doses e eliminar as contaminadas, evitando a transmissão de doenças. Possibilita a criação de “bancos de doses seminais” para abastecer as necessidades das explorações quando se proíbe a mobilidade dos animais, situações frequentes na espécie porcina e normalmente relacionadas com surtos infecciosos. E, por último, fomenta o comércio internacional de doses seminais. Estas importantes vantagens alimentam as investigações científicas para melhorar a eficiência produtiva do sémen criopreservado.
Figura 1. Tanque de azoto líquido para a conservação de doses seminais a -196°C. Detalhe das doses armazenadas no seu interior (imagem superior). |
Situação actual da criopreservação espermática
Tradicionalmente foi considerado o sémen criopreservado menos eficiente que o fresco e/ou refrigerado. A necessidade de utilizar um grande número de espermatozóides por dose de inseminação (entre 5.000 e 6.000 x106) aliado a uma intrínseca menor fertilidade (20% menos de partos e cerca 2 leitões a menos por ninhada) relegaram-no quase exclusivamente a programas muito específicos de melhoramento genético (Johnson y cols., 2000). Os avanços recentes no conhecimento das propriedades físico-térmicas que caracterizam e diferenciam os espermatozóides suínos (Devireddy y cols., 2004), que permitiram desenhar novos protocolos de criopreservação, junto com o desenvolvimento de novos procedimentos de inseminação, foram a chave para melhorar os rendimentos produtivos do sémen criopreservado (Roca y cols., 2006b). Entre as melhorias introduzidas nos protocolos de criopreservação destacam-se (1) a substituição das clássicas e pouco criogénicas palhetas de 5 mL para embalar e congelar os espermatozóides pelas de 0’5 mL ou os FlatPakcs (Figura 2) que permitem uma congelação mais homogénea, (2) a adequação das velocidades de congelação e descongelação à permeabilidade das membranas espermáticas e (3) a aplicação de biocongeladores horizontais (Figura 3), que permitem uma congelação uniforme de um grande número de doses seminais (Roca y cols., 2006a). Quanto aos novos procedimentos de inseminação, a denominada inseminação intrauterina profunda provou a sua eficiência ao conseguir taxas de partos de 75-80% com mais de 10 leitões nascidos por ninhada, inseminando com doses de apenas 1.000-2.000 x106 espermatozóides congelados-descongelados (Roca y cols., 2003; Bolarín y cols., 2006); o que, para além disso, permite rentabilizar melhor os varrascos dadores de sémen ao conseguir um maior número de doses de inseminação por ejaculado (entre 30 e 40 doses).
Figura 2. Imagens de crio-microscopía mostrando, da esquerda para a direita, as diferenças criogénicas entre as palhetas de 0,5 mL e as de 5 mL ou os FlatPack de 5 mL para embalar e congelar espermatozóides suínos (Eriksson y cols., 2001 Theriogenology; Ekwall y cols., 2007 Theriogenology; Hernández y cols., 2007 Cryobiology)
Figura 3. Biocongelador horizontal que permite a congelação uniforme de um grande número de palhetas (1). Detalhe dos rack carregados de palhetas (2) e a disposição de um rack no interior da câmara do biocongelador (3).
Possibilidades futuras do sémen criopreservado
Os avanços antes mencionados fazem com que o sémen criopreservado possa ser aplicado de maneira eficiente nos programas comerciais de IA. No entanto, para que se generalize a sua aplicação são necessários ainda alguns progressos, entre eles simplificar o processo de congelação e garantir que a inseminação seja realizada momentos antes da ovulação. O processo actual de congelação é laborioso e moroso (cerca de 4-5 horas), o que limita o número de laboratórios que o praticam e encarece o preço das doses de inseminação (com um custo mínimo 2-3 vezes superior ao das doses de sémen fresco ou refrigerado). Quanto ao intervalo inseminação-ovulação, a um maior intervalo corresponde a menor fertilidade (Figura 4). Melhorar a detecção do início do estro e controlar, com certa exactidão, a duração do mesmo, são actuações chave para uma aplicação eficiente do sémen criopreservado na espécie porcina. É sabido que a ovulação nas porcas produz-se passados dois terços do estro (Soede y Kemp, 1997). Este facto possibilita que as porcas possam ser inseminadas dentro das 6-8 h prévias à ovulação, o que possibilita obter com o sémen criopreservado taxas de parto muito semelhantes às conseguidas com sémen fresco e/ou refrigerado (Bolarín y cols., 2006).
Figura 4. Fertilidade do sémen fresco e criopreservado em porcas inseminadas a diferentes tempos relativamente à ovulação (Wabersky y cols., 1994 Theriogenology).