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Uso da inseminação artificial intrauterina em marrãs

A utilização da técnica de IAU em marrãs ainda é desafiadora devido às dificuldades na taxa de passagem do catéter pelo cérvix. E, além disso, o tempo necessário para a IAU, em comparação com multíparas, tende a ser maior.

A inseminação artificial intrauterina (IAU), ou também denominada pós-cervical, é aplicada com sucesso em porcas pluríparas e primíparas, sendo uma técnica já consolidada nestas categorias. Porém, ainda são poucos e recentes os estudos da técnica aplicada em marrãs, os quais apresentam diferentes resultados e abordagens.

A aplicação da técnica de IAU em marrãs ainda é limitada pela dificuldade de passagem do catéter pela parte cranial do cérvix, a qual representa claramente uma barreira importante devido as suas menores dimensões. Portanto, devido à esta limitação, ainda há necessidade das explorações manterem as duas técnicas (tradicional e intrauterina) na sua rotina, bem como a produção de doses de inseminação com diferentes números de espermatozóides e volume pelas unidades de processamento de sémen.

Acervo pessoal - Prof. Fernando Bortolozzo.
Acervo pessoal - Prof. Fernando Bortolozzo.

A IAU não tem sido recomendada para marrãs, devido à dificuldade de introdução do catéter. Entretanto, quando é possível a realização da IAU em marrãs, não há diferença no desempenho reprodutivo quando comparada com a inseminação artificial tradicional (intracervical) (Will et al., 2021a). Até ao momento são poucos os estudos que incluíram essa categoria de fêmeas, bem como utilizaram catéteres específicos para marrãs. No entanto, com a melhoria dos catéteres (material mais flexível), a sugestão da remoção do contacto com os machos durante a IAU, bem como a maior experiência dos operadores, aumentaram as taxas de sucesso de aplicação de IAU em nulíparas. Frente a esse novo cenário, a partir de 2017 os estudos de IAU em marrãs foram retomados e têm sido publicados nos últimos anos. Entretanto, a taxa de sucesso de aplicação da técnica em marrãs ainda é divergente entre os estudos (Tabela 1).

Tabela 1. Desempenho reprodutivo com o uso da inseminação artificial intrauterina (IAU) com diferentes números de espermatozóides e volume de doses de inseminação em marrãs.

Referência n1 Técnica de IA Tipo de pipieta + catéter2 Nº sptz (x109)3 Vol (mL)4 Taxa de fertilidade (%) Taxa de Parto (%) NT5 TS6 (%)
Dimitrov et al. (2007) 28 IAC7 - 3,0 100 - 87,5 10,3 -
19 IAU8 - + P 1,5 50 - 89,5 9,1 -
Hernández-Caravaca et al. (2017) 47 IAC - 3,0 80 - 93,6 13,7 -
56 IAU P + P 1,5 40 - 82,6 13,1 19,6
54 IAU M + P 1,5 40 - 93,3 13,2 37,0
63 IAU M + M 1,5 40 - 84,3 13,9 60,3
Tenus et al. (2017) 273 IAC - 2,5 80 - 89,4 11,6 -
279 IAU - 1,5 40 - 91,8 11,8 91,4
Suárez-Usbeck et al. (2019) 324 IAC - 3,0 90 91,4 85,8 18,3 -
248 IAU M + M 1,5 45 92,3 88,7 18,5 77,5
Llamas-López et al. (2019) 130 IAC - 2,5 85 87,5 83,6 13,7 -
1036 IACP9 L + L 1,5 45 89,8 87,5 13,1 88,9
Will (2021b) 158 IAC - 1,5 50 96,5 93,7 14,5
159 IAC - 2,5 80 97,7 95,6 14,5
90 IAU P + M 1,5 50 98,0 94,4 14,8 58,9
97 IAU P + M 2,5 80 95,3 93,8 14,5

1 Número de fêmeas inseminadas. 2 Pipeta de fixação cervical utilizada para multíparas (P) ou marrãs (M) + catéter intrauterino utilizado para multíparas (P) ou marrãs (M). 3 Número de espermatozóides (sptz) na dose de inseminação (x 109). 4 Volume da dose de inseminação. 5 Número total de leitões nascidos. 6 TS: taxa de sucesso de passagem do catéter intrauterino. 7 IAC: Inseminação artificial intracervical. 8 IAU – Inseminação artificial intrauterina. 9 IACP – Inseminação artificial intracervical profunda. Não houve diferença entre os tratamentos em nenhum estudo. Fonte: Will et al. (2021a).

Um facto que dificulta o entendimento do sucesso de passagem do catéter é a abordagem utilizada para definir a percentagem de passagem, o que muitas vezes não fica claro na descrição metodológica dos estudos. Isso porque a percentagem de passagem pode considerar as fêmeas em que foi possível a inserção em todas as inseminações durante o cio, a percentagem de fêmeas que receberam pelo menos uma IAU durante o cio ou, ainda, a percentagem de passagem do catéter intrauterino por inseminação realizada. Adicionalmente, a falta de informações de dimensões dos equipamentos utilizados dificulta identificar aqueles com maior potencial de aplicabilidade para a IAU. Também falta padronização relativamente às características das marrãs no momento da inseminação (idade, peso, condição corporal e número de cio prévios), tornando mais difícil a conclusão sobre as possibilidades de uso da IAU em marrãs.

Perante as observações de dificuldade de inserção do catéter através do cérvix, as estratégias consideraram o desenvolvimento de dispositivos específicos para IAU em marrãs. Nesse sentido, Will et al. (2021b), utilizando um catéter específico para marrãs (3,0 mm de diâmetro, alcançando até 13 cm além da extremidade da dose), observaram percentuais de sucesso de inserção do catéter intrauterino próximos a 60%, considerando marrãs que permitiram a inserção do catéter (≥ 7 cm) em todas as inseminações realizadas durante o cio. Além disso, no mesmo estudo, observaram que em média houve a necessidade de duas tentativas (com intervalo de 5 min entre elas) para passagem do catéter. Com isso, não houve redução no tempo para execução da técnica quando comparada a IAC, devido à dificuldade de passagem do catéter pelo cérvix, mostrando que a aplicação da IAU em marrãs ainda é um desafio.

Outra questão é relacionado com o efeito da idade e peso das marrãs no sucesso da IAU. Will et al. (2021b) observaram maior possibilidade (>60%) de inserção do catéter em marrãs mais pesadas no primeiro cio detectado (≥ 124 kg), e em marrãs mais velhas (≥ 225 d) e maior pontuação da condição corporal (>3) na inseminação (Tabela 2). Desta forma, deve ser considerado um possível efeito da idade e peso das marrãs na taxa de sucesso de aplicação da IAU. Portanto, ainda faltam informações representativas que considerem a passagem do catéter nas distintas linhagens genéticas em função das diferenças na conformação física, bem como nas recomendações de idade e peso para a primeira inseminação. Essas características são relativamente fáceis de medir na rotina da exploração, e compreender seu efeito para a recomendação da utilização da IAU em marrãs.

Sendo assim, a utilização da técnica de IAU em marrãs ainda é um desafio devido às dificuldades na taxa de passagem do catéter pelo cérvix. E, além disso, o tempo necessário para a IAU, em comparação com multíparas, tende a ser maior. Portanto, ainda há necessidade de maior compreensão de possíveis efeitos de factores genéticos e das características físicas das marrãs para que a técnica possa ser aperfeiçoada e que o seu uso em larga escala possa ser recomendado.

Tabela 2. Taxa de sucesso (%) de passagem do catéter intrauterino através da cérvix de marrãs de acordo com diferentes classes de idade, pontuação de condição corporal visual (ECV), unidades de calibre e peso ao cio prévio à inseminação.

Classes de variáveis corporais n Idade (dias)1 P-valores
≤224 225-241 ≥242 Idade Classe2 Idade*Classe
n 80 157 82
ECV1 <0,01 0,27 0,09
2,5 65 36,8by 60,6by 61,5by
3 177 53,1by 57,0by 54,8by
>3 77 33,3by 71,1bx 88,9ax
Calibre1 0,01 0,34 0,10
<13 68 52,4bx 55,9bx 61,5bx
13-14 170 47,7bx 60,2bx 55,8bx
>14 81 33,3bz 67,5by 88,5ax
Peso (Kg)3 0,01 0,04 0,06
<124 78 36,7bx 50,0bx 42,9bx
124-140 162 60,5ax 59,6bx 62,9ax
>140 79 25,0by 76,5ax 81,8ax

1 Os dados das variáveis idade, ECV e calibre foram recolhidas no momento da inseminação (2º cio). 2 Classes de variáveis corporais. 3 A variável peso foi medida no cio prévio ao cio da inseminação. Nesse estudo, a taxa de sucesso foi definida como a percentagem de marrãs que permitiram a passagem do catéter intrauterino através do cérvix em todas as inseminações em que foram submetidas durante o cio. A interacção foi considerada como tendência (P > 0,05 e P ≤ 0,10). a-b na coluna indicam tendência de diferença entre as classes de variáveis corporais. x-z na linha indica tendência de diferença entre as classes de idade. Fonte: Will et al. (2021a).

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