Certas tendências dietéticas actuais manifestam reservas sobre o valor nutritivo e os efeitos do consumo de carne, que muitas vezes se focam de uma maneira especial no porco. Este facto não é novo, vem de longe. Determinados mandamentos religiosos determinam prescindir do porco, e não de outras carnes, por exemplo. A associação, inclusive na linguagem coloquial, do porco com sujidade também não ajuda. No momento de considerar o valor nutritivo de um alimento não nos podemos deixar influenciar por reservas de ordem emocional ou cultural, mas sim avaliar os nutrientes que nos fornece.
A carne de porco contém 18-20% de proteínas de alto valor biológico. Praticamente não tem hidratos de carbono. É rica em vitaminas do grupo B e em minerais como ferro, zinco, fósforo e potássio. Tem pouco sódio, o que é positivo se mantivermos este conteúdo baixo ao cozinhar ou, principalmente, na preparação de derivados (enchidos). A presença de purinas (precursoras do ácido úrico) é moderada. O conteúdo calórico não é muito alto (120-330 kcal/100 g), principalmente nas partes magras. Por outro lado, os enchidos fornecem mais energia (400-600 kcal/100 g), razão pela qual devem ser consumidos com bastante moderação.
Ainda hoje, há prescritores de dietas que continuam a seguir-se pelos valores antigos da composição do porco, especialmente relativamente aos níveis e características da sua gordura (Castro Cardoso Pereira, P.M de e Reis Baltazar Vicente, A.F. dos; 2013). Os porcos de antes tinham, em média, 30-40% de gordura, ao passo que os actuais têm por volta de 17-20%, dependendo muito se tratarem de peças magras (4,5%) ou gordas (32%). Os ácidos gordos saturados, a ingestão destes deve ser baixa, não são os maioritários (entre 2-9 g por 100 g de carne). Por outro lado, a gordura dos porcos, sobretudo da maioria dos actuais, é rica em ácidos gordos monoinssaturados (ácido oleico, especialmente, entre 2-12 g/100 g de carne), cujo papel é positivo para a saúde. A relação ácidos gordos saturados/insaturados, que quanto mais baixa mais saudável é, na gordura de porco, de cerca de 0,76, abaixo da gordura de bovino (1,31) e de borrego (0,98), e não muito acima da de frango (0,45). Além disso, a fisiologia do porco (animal monogástrico, como os humanos, ao contrário do bovino e ovino que são rumiantes) permite com bastante facilidade melhorar a sua gordura através da alimentação (com milho, soja ou linhaça), de modo que o conteúdo em ácido oleico pode chegar a ser da ordem dos 50% de todos os ácidos gordos e, no porco ibérico, dado que se alimenta de bolotas, até 70%. Inclui, também, até 15% de ácidos gordos poli-insaturados (0,4-4,5 g por 100 g de carne), o que é nutricionalmente interessante e destacável em produtos de carne. Neste caso a qualidade gastronómica está de acordo com a nutricional. O conteúdo em colesterol da carne de porco é moderado (60-80 mg/100g, o limite diário é de 300 mg).
Um exemplo dos possíveis efeitos positivos da integração da carne de porco numa dieta equilibrada é dado pelo trabalho de McArthur e colaboradores (McArthur J.O. et al., 2014) que observam que chegando a 500 g/semana (quantidade bastante elevada mas que seria aceitável se não forem ingeridas outras carnes) a dieta melhora e a ingesta de alimentos de alto valor energético e pobres em nutrientes diminui, o que atribuem a um bom conhecimento dos alimentos e do que se tem que comer, mas também ao poder saciante da carne de porco. Seguramente também se podia dizer o mesmo de outras carnes ou alimentos.
Definitivamente, o porco é uma carne saudável, se integrada correctamente numa dieta equilibrada. No caso dos enchidos, a não ser que sejam baixos em gordura e sal, esta quantidade deve ser mais estrita. Continua vigente o que diziam, em 1998, Mataix e Muñoz: "quando se mantém a recomendação de ingerir de preferência carnes magras, o melhor conselho nutricional que se pode dar ao consumidor do ponto de vista da saúde, assim como da diversidade alimentar, é que coma tanto frango como porco, porque da perspectiva de quantidade e qualidade de gordura a influencia sobre a saúde será praticamente a mesma” (Mataix J. e Muñoz A., 1998).