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Caso clínico: Vómitos em leitões desmamados

O uso de determinados medicamentos pode provocar reacções alérgicas em suínos, tal como nos humando. Foi o que aconteceu neste caso

3 Novembro 2008
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Descrição da Exploração



Trata-se de uma exploração de ciclo fechado com capacidade para 1000 porcas ainda que actualmente não chegue às 900. Os desmames são semanais e a reposição é de origem externa. Últimamente mudou-se o fornecedor e a genética da reposição.

Sanidade da exploração

A exploração é positiva à PRRS, Aujeszky, micoplasma e Actinobacillus pleuropneumoniae. A PRRS flutua causando mais ou menos problemas segundo a época. Vacinam-se as porcas três vezes por ano contra a Aujeszky e também três vezes os porcos, a última aos 6 meses de idade. O Actinobacillus causa algumas baixas nos porcos de engorda cerca dos 100 quilos. Para controlá-lo fazem-se medicações periódicas com amoxicilina às porcas e na engorde.

De vez em quando medica-se toda a exploração com lincomicina já que se tem historial de diarreias que podem chegar a ser de sangue mas com etiologia ainda por determinar. As primíparas estão a entrar com demasiada idade, sem tempo para uma boa adaptação.

As rações de desmame medicam-se com clortetraciclina e colistina no pré-starter e amoxicilina no starter para prevenir os problemas de meningite e diarreias que aparecem com frequência.

Estrutura da exploração

Esta exploração foi reformada várias vezes até conseguir ter uma distribuição muito desordenada e pouco proporcionada.

Os leitões recém desmamados permanecem durante uma semana numa primeira instalação de transição. Estas salas são demasiado pequenas para receber todo o grupo, pelo que estes leitões estarão uma semana em alta densidade e com um sistema de ventilação totalmente ineficaz. Nesta zona só existe espaço para um lote pelo que devem mudar-se antes de se realizar o desmame seguinte para uma espécie de pre-engorda.

Pessoal

A taxa de rotação do pessoal tem sido sempre muito elevada, a este facto temos que somar em alguns casos o da pouca compreensão (basicamente de idioma) do pessoal.


Aparecimento do Caso



Durante uma visita rotineia é-nos comentado que de vez em quando aparece diarreia nos leitões lactantes. Esta diarreia é transitória e desaparece sem tratamento nem baixas. Isto já ocorre há aproximadamente dois meses e meio. Pede-se que avisem quando apareçam novos casos.

Somos chamados trâs dias depois porque voltam a aparecer diarreias. Contudo, observamos que o que os leitões tinham não era diarreia, mas sim vómitos. Os leitões afectados, aparte de vomitar, passavam umas horas deitados, apáticos mas sem febre nem nenhum outro síntoma . Não se chegou a aprofundar o tema já que não era preocupante. Afectaba muito poucos leitões, cerca de 1-2%. A mortalidade era casi nula.

Depois de 1 mês sem nenhum caso, os vómitos voltam a aparecer, mas agora justo depois do desmame. No momento do desmame os leitões recebiam a segunda dose da vacina contra micoplasma e uma dose preventiva de amoxicilina.

Uma hora e pouco após estarem nas salas de "desmame" começaram a vomitar entre 10 e 20% dos leitões.

A apresentação era a mesma que nos casos anteriores só que havia aumentado a incidência e os leitões eram mais velhos. Não se observou mortalidade.


Evolução do Caso



Ao realizar o desmame da semana seguinte repitiu-se o quadro.

Dentro do diagnóstico diferencial de causas que provoquem vómitos encontramos:



  • Diarreia epidémica suína ou gastroenterite transmissível. Em princípio descartada porque não se observaram problemas de diarreias graves nem mortalidade.
  • Úlceras gástricas. É muito puoco frequente em leitões lactantes e não se observaram fezes escuras e os leitões recuperavam-se em pouco tempo ...
  • Actinobacillus pleuropneumoniae. Normalmente afecta porcos de 8 a 16 semanas de idade com um período de incubação muito curto. Pode ocorrer com vómitos.
  • Diarreia por E. coli. A diarreia nos leitões pode ocorrer em qualquer idade. Ao desmamar, produz-se uma diarreia aguda dentro dos 5 dias pós-destete.
  • Encefalomielite hemaglutinante. Ainda que o vírus causante esteja amplamente espalhado, a doença clínica é pouco frequente e só em leitões recém-nascidos.
  • Intoxicação por alguma substância possivelmente no pré-starter: arsénicos inorganicos, cádmio, organofosfatos, carbamatos… Esta possibilidade não se chegou a contemplar devido à dificuldade de análise e à baixa gravidade do problema ao inicio.
  • Peste Suína Clássica ou Africana. Estas doenças podem causar vómitos, mas não se observou nenhum dos outros sintomas: diarreia, descoordenação, amontoamento, febre e elevada mortalidade.

Não se realizou nenhuma prova de diagnóstico. A ausência de baixas e consequências posteriores levou o caso para uma simples anedota.


Resolução do Caso



Durante uma visita posterior à exploração contemplamos como começam a vomitar 100% dos leitões que se tinham desmamado há pouco menos de uma hora. Durante os 2 últimos meses não se tinha observado nenhum outro caso.

Ao investigar de novo as possíveis causas observou-se um facto relevante. A diferença dos outros desmames, neste tinha-se mudado o antibiótico com que se tratavam os leitões de forma sistemática. Em vez de amoxicilina, utilizou-se Penicilina G procaína. O motivo da mudança não foi outro senão que a amoxicilina acabou. À falta do primeiro decidiu-se utilizar o segundo, do qual havia suficiente para injectar todos os leitões do desmame da semana.
Na farmácia da exploração havia alguns anos em que ficava um stock de penicilina G procaína que se tinha utilizado anteriormente para o tratamento das porcas. O antibiótico não estava fora de prazo e tinha bom aspecto.

Os trabalhadores da maternidade asseguraram que nunca o tinham usado. Estavam há pouco mais de ano e meio na exploração, tempo em que a penicilina G procaína já não se usava. Para o comprovar reviu-se o inventário desde que começaram os primeiros vómitos. Não havia saídas registadas mas faltavam frascos.

Chegou-se à conclusão que de vez em quando se utilizava um frasco de penicilina em vez de amoxicilina por engano. Os dois antibióticos eram do mesmo laboratório, com as mesmas cores e caixas quase idênticas. Para maior confusão estavam colocadas de lado. A penicilina G procaína ficava mais à mão à medida que as existências de amoxicilina se reduziam.

Desde que se evidenciou o erro não voltaram a observar-se mais casos de vómitos em leitões lactantes ou recém desmamados.


Comentários



Os casos de vómitos que se iam repetindo na exploração eram causados por um efeito secundário à injecção de um antibiótico, a penicilina G procaína. A penicilina G procaína pode produzir reacções alérgicas de diversa intensidade em animais sensíveis. Em tais casos aconselha-se o uso do antídoto adequado: epinefrina. Adrenalina, cortisona, anti-histamínicos, iones Ca++...

Tanto na primeira como na segunda semana de vómitos ao desmame, não se podia associar nenhum parque ou e nenhuma sala de maternidade ou tratamento prévio já que os leitões se misturavam no corredor antes de serem metidos nos parques. Além do mais, antes do desmame não se tinha observado nada.

No diagnóstico diferencial estudou-se a possibilidade do Actinobacillus pleuropneumoniae, presente na exploração e causador de baixas na engorda. A sua forma hiperaguda produz vómitos em leitões já desmamados. De repente aparecem um ou mais leitões do mesmo ou de diferentes parques muito doentes com febre, apatia e anorexia. Passam um curto período de diarreia leve e vómitos. Durante esta fase permanecem deitados sem sintomas respiratórios. Passado um tempo tornam-se cianóticos, aparece dispneia severa e respiração pela boca. Antes da morte normalmente apresentam uma descarga de sangue espumoso pela boca e focinho. A morte produz-se 24-36 horas após o início dos sintomas. Os vómitos nesta exploração não são acompanhados de mortalidade nem de sintomas respiratórios nem febre. Tampouco houve aumento da incidência de actino na engorda.

Outras possíveis causas de aparecimento de vómitos que foram descartadas são:

  • Intoxicação por alguma substância possivelmente no pré-starter: arsénicos inorgânicos, cádmio, organofosfatos, carbamatos…
  • Diarreia epidémica suína ou gastroenterite transmissível. Causadas por um coronavirus, os leitões imunizam-se através do colostro. Não se podem diferenciar uma da outra pelos sinais clínicos. Em grandes populações nem todas as porcas se infectam ao mesmo tempo e podem dar-se surtos sucessivos afectando os leitões lactantes de maneira esporádica. Em leitões lactantes a mortalidade pode chegar aos 40% e a diarreia dura até 7-14 dias. Os leitões afectados apresentam diarreia aguda aquosa, desidratação e vómitos.
  • Úlceras gástricas. A sua incidência em porcos em crescimento pode chegar aos 60%. É pouco frequente em leitões lactantes. Nas baterias, na sua forma menos aguda o porco apresenta debilidade e falta de alento, vómitos, fezes escuras...
  • Actinobacillus pleuropneumoniae. Normalmente afecta os porcos de 8 a 16 semanas de idade com um período de incubação muito curto.
  • Diarreia por E. coli. A diarreia nos leitões pode ocorrer em qualquer idade. Ao desmamar, produz-se uma diarreia aguda dentro dos 5 dias pós-desmame. " Encefalomielite hemaglutinante. Ainda que o vírus causante esteja amplamente espalhado, a doença clínica é pouco frequente e só em leitões recém-nascidos.
  • Peste Suína Clássica ou Africana. Estas doenças víricas produzem vómitos, diarreia, descoordenação, amontoamento e frio nos leitões lactantes. A febre é muito alta e produzem-se mortes súbitas. Transmite-se rapidamente por carnes infectadas, por transmissão mecânica (botas, roupa, camiões...).
  • Golpe de calor: Durante as épocas de maior calor e em situações de má ventilação e amontoamento dos leitões no momento do desmame, outro factor desencadeante dos vómitos poderia ser o golpe de calor.

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